domingo, 10 de maio de 2009

Reforma do Palácio do Planalto prevê a remoção de painéis de Athos Bulcão

Reforma do Palácio do Planalto prevê a remoção de painéis do artista erguidos em meio a jardim de Burle Marx. Os azulejos seriam instalados em outro lugar do prédio, mas há o temor de que muitos se quebrem


Publicação: 06/05/2009 09:17 Atualização: 06/05/2009 10:13
Trabalhos assinados pelo artista plástico Athos Bulcão e o paisagista Roberto Burle Marx estão em perigo desde o início da reforma do Palácio do Planalto. Projeto feito pelo escritório do arquiteto Oscar Niemeyer em Brasília prevê a remoção de três painéis de azulejos, integrados a um jardim de inverno de um dos andares do edifício-sede da Presidência da República. A justificativa é recolocá-los em lugar mais acessível ao público. Mas entidades ligadas à preservação do patrimônio de Brasília temem a destruição das obras de arte e denunciam descaso.

A discussão começou em janeiro deste ano. Carta enviada pela Secretaria de Administração da Casa Civil pediu à Fundação Athos Bulcão (Fundathos) para acompanhar as reformulações no 4º piso do prédio. O documento, assinado pelo secretário-substituto de Administração da Casa Civil, Antônio Fúcio de Mendonça Neto, cita a retirada dos painéis do artista plástico. “Solicito que essa Fundação proceda ao remanejamento do painel de Athos Bulcão nestas instalações, a fim de resguardar sua integridade e manutenção, para posterior recolocação em momento oportuno” escreveu ele, no dia 20.

A diretora executiva da Fundathos, Valéria Cabral, estranhou o pedido. Entrou em contato com a Presidência e visitou o local para rever os painéis. “Disse para eles que a fundação não faz esse tipo de coisa. Mas o que causa mais estranheza é que a decisão de remover tudo está tomada. Vão derrubar o trabalho de um homem que completaria 100 anos agora (Burle Marx) e de outro que morreu não faz nem um (Bulcão). Isso às vésperas de Brasília chegar aos 50 anos. Imagina o que farão no centenário”.

Mesmo assim, Valéria pediu que o técnico em conservação e restauração Wagner Matias de Sousa avaliasse a possibilidade de transferência das obras. O responsável pela restauração dos azulejos da Igrejinha Nossa Senhora de Fátima, na 307/308 Sul — danificados por um incêndio no início do ano — esteve no 4º andar do Palácio do Planalto. Reparou que há como remover os painéis, mas não sem chance de se quebrar muitos azulejos — há três blocos de paredes, com azulejos desenhados em verde e azul, integradas aos jardins de Burle Marx.

Wagner classificou a remoção como “possível”, mas de “alto risco e de alto custo”. A operação obrigaria os responsáveis pela obra a repartir os painéis. Não há técnicas capazes de retirá-los por inteiro — os azulejos estão em bom estado de conservação, mas concretados. “A chance de quebra é grande. Mesmo a remoção por blocos seria traumática, pois existe a possibilidade de os azulejos se fragmentarem. Neste caso, seria necessário refazer as peças danificadas pela intervenção”, explicou o restaurador.

Niemeyer
O Palácio do Planalto é um projeto do arquiteto Oscar Niemeyer, inaugurado no mesmo dia da nova capital, em 21 de abril de 1960. A construção da sede do Executivo federal começou em 10 de julho de 1958. O prédio de 36 mil metros quadrados tem quatro andares. O último pavimento abriga os escritórios da Casa Civil e do Gabinete de Segurança Institucional. É onde a composição feita pelos painéis de Athos Bulcão e os jardins de Burle Marx se mantém fixada na parte central do piso. A partir da reforma, no entanto, será desconfigurada.

Segundo o arquiteto Carlos Magalhães, representante do escritório de Niemeyer em Brasília, o projeto prevê a reformulação completa do lugar também para deixar as obras mais expostas aos visitantes. “As mudanças farão com que a transferência dos azulejos permita montar uma parede mais à vista de todos”, defendeu. Segundo Magalhães, a relocação das peças será feita com cuidado para não destruir o trabalho. “Tudo será feito para preservar o patrimônio. Temos como fazer isso sem destruí-lo ”, afirmou.

A Casa Civil informou, por meio de nota divulgada pela assessoria de imprensa, que “todo o trabalho será realizado dentro dos padrões de excelência técnica exigidos pela sua importância, buscando para tanto, como já está sendo feito, o apoio de outros órgãos, como por exemplo: do Iphan e da Fundathos”. Segundo o comunicado, o projeto da reforma foi elaborado por Niemeyer. Cita ainda trecho de carta do próprio arquiteto, que “para os azulejos de Athos Bulcão, aplicados nos jardins do quarto pavimento, previmos parede específica no saguão projetado nesse mesmo piso”. As obras continuam intocadas.

A nota conclui com a afirmação de que as alterações contam com o aval do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Porém, o superintendente regional do órgão, Alfredo Gastal, não apoia as modificações. “É absolutamente incoerente que isso esteja sendo feito desta forma. Mas o Iphan se detém hoje por um problema ético, pois o projeto é do próprio Niemeyer”, disse. O Iphan e a Diretoria de Patrimônio Histórico e Artístico (Depha) elaboram um inventário dos trabalhos de Bulcão para que sejam tombados como Patrimônio Artístico e Cultural.

Leia a íntegra da matéria na edição impressa do Correio Braziliense

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