domingo, 10 de maio de 2009

Pesquisadores estudam efeitos do aquecimento global nos recifes





Publicação: 09/05/2009 08:10 Atualização: 09/05/2009 08:16
Salvador e Arraial D’Ajuda (BA) — A sala de número 106b, no primeiro andar do Instituto de Geociências da Universidade Federal da Bahia (UFBA), abriga um tesouro científico. Os guardiões são os professores Marília Oliveira, Zelinda Leão e Ruy Kikuchi, responsáveis por montar um laboratório para estudar a adaptação dos recifes de corais às mudanças climáticas e à acidificação dos oceanos.

O laboratório é um conjunto de três aquários, com volume total de apenas 600 litros d’água, onde a temperatura é controlada por aquecedores e refrigeradores ligados a termostatos. A escolha do recife de coral para o estudo é simples de ser explicada, afinal ele é o primeiro ambiente a sofrer os impactos do aquecimento global — e considerado o melhor termômetro disponível para avaliar o descaso e da degradação do homem.

O mais recente estudo do grupo da UFBA trata-se de uma monografia defendida por Mariana M. Silva sobre a tolerância de colônias de coral ao aumento da temperatura — provocado pela emissão de gases poluentes na atmosfera. Os resultados mostram que, caso o aquecimento global piore, muitas espécies marinhas serão afetadas.

No caso dos recifes, tal elevação da temperatura pode fazer com que eles deixem de servir de abrigo, berçário e fonte de alimentos. A partir daí, não é preciso ser um cientista para imaginar as consequências desastrosas para o homem, a começar pela própria perda nos estoques pesqueiros e na qualidade dos alimentos consumidos.

Dois problemas provocados pela poluição degradam os recifes: o próprio aquecimento e a acidificação da água do mar. Cada um a seu modo dificulta o crescimento dos corais. O aquecimento provoca a degeneração das algas, o que provoca o braqueamento nos corais, que, para se manterem saudáveis, precisam de águas com temperatura entre 23ºC e 28ºC. No caso da acidificação, explica-se: o mar absorve cerca de 42% do gás carbônico produzido por atividades humanas. Na água, o CO² transforma-se em ácido carbônico, que, a partir de determinados níveis, é capaz de dissolver a estrutura dos corais.

O trabalho de Mariana se resumiu aos efeitos do aumento da temperatura na superfície da água do mar sobre os corais. O experimento começou com a coleta de colônias de corais na Baía de Todos os Santos, em Salvador. Os corais da espécie Siderastrea stellata foram transferidos para os tanques da universidade e mantidos por 30 dias a uma temperatura de 26ºC. Depois, foram distribuídos nos aquários do laboratório da UFBA, a 26ºC, 28ºC e 30ºC ao longo de dois meses — a temperatura nos dois últimos foi gradativamente elevada 0,5°C a cada quatro dias em dois dos aquários.

O resultado do trabalho mostrou que a elevação gradativa da temperatura provocou alterações na cor das colônias a partir dos 28,5ºC. Aquelas expostas a 30°C mudaram de tonalidade e branquearam, ou seja, iniciaram um processo de degeneração. Ao fim do trabalho, os pesquisadores concluíram que a espécie Siderastrea stellata apresenta uma tolerância térmica maior do que outras espécies de corais. “Mas se a temperatura aumenta e permanece alta por um período longo de tempo, extrapolando o limite de tolerância das espécies de corais, eles não têm tempo suficiente para se adaptar às novas condições do ambiente”, diz Marília Oliveira.

Branqueamento
No Brasil, os efeitos das mudanças climáticas e o consequente branqueamento das colônias de corais ainda são menores do que os verificados no Atlântico Norte. Por aqui, as colônias de corais que um dia branquearam por conta de eventos de aumento de temperatura conseguiram se recuperar ao longo do tempo. Lá, morreram. Levantamento feito por um grupo de cientistas do Global Coral Reef Monitoring Network (GCRMN) — entidade composta por governos e ONGs — aponta que o impacto das mudanças climáticas na superfície do mar brasileiro chega ao nível 2, numa escala de 0 a 5, onde o maior número indica o risco mais acentuado.

No litoral da Colômbia, por exemplo, onde a reportagem do Correio realizou dois mergulhos numa primeira etapa desta investigação, em novembro de 2008, o nível é 5. Há uma série de variáveis — como por exemplo, as espécies predominantes em cada região —, e uma comparação entre o Brasil e a Colômbia seria impossível. Mas um estudo feito por pesquisadores da Universidade Federal do Rio de Janeiro, em novembro do ano passado, na base do Projeto Coral Vivo em Arraial d’Ajuda (BA), aponta para um fator de proteção dos corais brasileiros. Os resultados sugerem que outra espécie testada, a Mussismilia harttii, é sensível a mudanças de temperatura da água do mar, especialmente em condições de maior luminosidade. A proteção dos corais viria da turbidez natural das águas onde está a maioria dos recifes brasileiros, impedindo maiores consequências nos eventos de braqueamento observados no país.

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